Desde os tempos do cinema mudo, Hollywood apostou na figura dos galãs latinos, os latins lovers das telas. O sucesso de Rudolph Valentino abriu portas para nomes como Ramon Novarro, Fernando Lamas e muitos outros.
Nem todos tiveram carreiras muito bem sucedidas no cinema, como é o caso do mexicano José Mojica, que foi lançado como astro, mas não agradou muito aos estúdios. Porém, apesar de não obtido grande exito em Hollywood, Mojica se tornou um grande astro na América Latina, e abandonou a carreira no auge, para ingressar na vida reliosa, tornando-se padre, em 1941.
E mesmo vestindo o hábito de monge, ele nunca deixou totalmente a vida artística, e continuou cantando e lançando discos, sendo inclusive um dos pioneiros da televisão brasileira.
Crecenciano Abel Exaltación de la Cruz José de Jesus Mojica Montenegro y Chavarín nasceu em San Gabriel, México, em 14 de setembro de 1896. Filho único de um rico fazendeiro, José Mojica teve uma educação primorosa, tendo aulas de canto, piano e violão.
Desde cedo, o menino desejava ser artista, mas seu pai o queria tomando conta dos negócios. Ele começou estudando agronomia, mas desistiu do curso, e formou-se engenheiro, para cumprir ordens do seu pai. Mas incentivado pela mãe, abandonou o México com 500 dólares no bolso e mudou-se para Nova York, onde estudou canto no Conservatório Nacional de Música.
Seus primeiros tempos na cidade não foram facéis, e ele precisou trabalhar como lavador de pratos. Mas sua sorte mudou quando o jovem conseguiu fazer uma audição para o tenor italiano Enrico Caruso, que incentivou sua carreira.
Caruso conseguiu para ele um contrato com a Companhia de Ópera Cívica de Chicago, onde ele começou a despontar profissionalmente.
José Mojica, cantor de ópera
Em 1917 Mojica retornou ao México, agora contratado pela Companhia de Espetáculos Cultos S.A., fazendo o papel de Rodrigo em Otelo de Giuseppe Verdi. Depois fez uma temporada na Ópera de Chicago, onde faz papéis pequenos, até que em 1921 conseguiu um papel de destaque em O Amor das Três Laranjas de Prokofiev, que teve um enorme êxito.
O tenor, agora respeitado, passou a gravar discos em 1926, fazendo sucesso também no rádio norte-americano. O artista chamou a atenção da Fox, que o contratou para estrelar Loucuras de Um Beijo (One Mad Kiss, 1930), um musical co-estrelado pela argentina Mona Maris.
Era o tempo dos primeiros filmes sonoros, e os estúdios investiam muito em filmes musicais, e um galã latino que cantava parecia uma grande aposta.
Os filmes sonoros haviam surgido em 1927, e os estúdios ainda desconheciam o processo de dublagem ou legendagem, e para não perder o mercado internacional dos países que não falavam inglês, eram feitas versões faladas em outros idiomas, como o espanhol, o alemão, o francês e até português. O mesmo elenco de Loucuras de Um Beijo gravou então a versão espanhola, chamada El Precio de un Beso (1930).
Mas o galã latino não obteve os resultados esperados. Com Mojica sobre contrato, a Fox então passou a escalá-lo para estrelar apenas as versões latinas de grandes sucessos. Assim ele protagonizou filmes como O Domador de Mulheres (Cuando el amor ríe, 1930), Prínipe Sem Amor (Hay qye casar al príncipe, 1931), A Lei do Harém (La Ley del Haren, 1931), Meu Único Amor (Mi Último Amor, 1931), Cavalheiro da Noite (Ela Caballero de la Noche, 1932) e As Fronteiras do Amor (Las Fronteras del Amor, 1934).
Apesar de estrelar sub produtos dos estúdios hollywoodianos, alguns de seus filmes fizeram muito sucesso no Brasil, como Melodia Proibida (Melodía Proibida, 1933), O Rei dos Ciganos (El Rey de los Gitanos, 1933), Capitão dos Cossacos (Un Capitan de Cosacos, 1934) e Entre a Cruz e a Espada (la Cruz y la Espada, 1934). Neste último, Mojica intepretava um padre.
José Mojica e Conchita Montenegro em Melodia Proibida
José Mojica em Entre a Cruz e a Espada
O ator causava curiosidade em Hollywood, pois nunca era visto com namoradas ou em companhia de outras mulheres, e havia mandando buscar a mãe no México, que morava com ele em sua mansão em Los Angeles. Muitos o acusavam de afeminado.
Em 1934 ele foi dispensado da Fox, mas continuou gravando discos de sucesso. Foi nesta época também que começou a viajar pela América Latina, fazendo apresentações em rádios e cassinos. Em 1937 esteve pela primeira vez no Brasil, como atração internacional contratada pela Rádio Mayrink Veiga.
José Mojica no microfone da Rádio Mayrink Veiga
Sem emprego em Hollywood, ele retornou às telas do cinema no México, no filme O Capitão Aventureiro (El Capitán Aventurero, 1939). No país ele ainda atuou em A Canção do Milagre (La Canción del Milagro, 1940).
Em 1941, esteve de novo no Brasil, desta vez contratado pelo Cassino da Urca.
José Mojica, no Cassino da Urca
José Mojica com a atriz brasileira Heloisa Helena
Após a turnê brasileira, ele voltou para a Opera de Chicago, onde fez o papel de Fenton em Falstaff, de Verdi. Depois partiu para uma série de apresentações no Peru. Foi lá que ele soube do falecimento de sua mãe, e onde teve sua revelação espiritual. Ele vendeu todas as suas posses mundanas e ingressou na Ordem Franciscana no Peru, recebendo o nome de Frei José de Guadalupe Mojica.
José Mojica em sua casa, em Hollywood
Após ingressar no monastério, ainda foi lançado seu último filme, Melodias da América (Melodías de América, 1942), gravado durante sua turnê pela Argentina.
Frei José Mojica passou a viver recluso, longe da mídia. Mas seus superiores acharam que seu nome famoso poderia ser uma boa ferramenta para pregar a palavra, e convenceram ele a voltar a gravar discos e fazer apresentações.
Em 1950 ele retornou ao Brasil, contratado pela Rádio Tupi. Em 01 de junho daquele ano, o empresário Assis Chateubriand, dono da rádio, fez os testes inaugurais da PRF-3 TV Tupi, que estrearia oficialmente em 18 de setembro de 1950.
Da sede dos Diários Associados, Frei José Mojica cantou diante das câmeras da iniciante televisão brasileira.
O programa era patrocinado pela Goiaba Peixe, o primeiro patrocinador da televisão Brasileira. Cerca de 10 mil pessoas assistiram ao show experimental da TV brasileira (que ainda contou com a participação do cantor Ortiz Tirado). E como ainda não haviam aparelhos televisores no país, Chateubriand espalhou cerca de 200 deles em pontos específicos da cidade, como Jockey Club e no saguão do prédio dos Diários Associados, na Rua 07 de Abril, em São Paulo.
Pessoas assistindo a pré-estréia da televisão brasileira
Mas engana-se quem pensa que ele cantou temas religiosos no programa. Mojica cantou alguns de seus maiores sucessos dos tempos de galã latino, incluindo os boleros Solamente Una Vez, e Júrame, um de seus maiores hits.
Assim, a televisão brasileira começou com um padre mexicano interpretando uma canção que pedia beijos que o levassem a loucura!
Em janeiro de 1951, José Mojica também cantaria no programa inaugural da TV Tupi do Rio de Janeiro.
José Mojica, cantando nos testes inaugurais da TV Tupi
Em 1953 José Mojica retornaria ao cinema, atuando em um filme religioso, feito na Espanha, chamado Pórtico da Glória (El Pórtico de la Glória, 1953). E em agosto 1955, retornou ao Brasil, desta vez para se apresentar nas Organizações Victor Costa (futuramente chamada de TV Paulista).
Durante sua estada aqui, morreu nos Estados Unidos a cantora e atriz Carmen Miranda, e foi Mojica quem rezou a missa em sua homenagem, na cidade de São Paulo. Na OVC ele também conheceu o brasileiro Pedro Geraldo, estudante de engenharia cuja semelhança com Mojica, nos tempos da juventude, impressionava.
Pedro Geraldo havia sido descoberto por Álvaro de Moya, e havia sido contratado pelo canal para estrelar o teleteatro Eu Pecador, baseado na biografia publicada por José Mojica no mesmo ano.
Em 1959, a Pelmex, um dos maiores estúdios do México, adaptou Eu Pecador (Yo Pecador, 1959), para às telas de cinema. José Mojica indicou o brasileiro Pedro Geraldo para o papel. O filme ainda tinha no elenco a estrela Libertad Lamarque, como a mãe de Mojica.
O próprio José Mojica também fez uma participação na película.
José Mojica ainda retornaria ao Brasil em 1962 e 1967, mesmo ano em que fez seu último filme, o mexicano Seguirei Teus Passos (Seguiré Tu Pasos, 1967).
Em 20 de setembro de 1974 Frei José Guadalupe Mojica faleceu de problemas cardíacos, no monastério onde vivia em Lima, Peru. Ele havia completado 78 anos de idade apenas 06 dias antes de falecer.
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2 Comentários
Creio que foi em 1967, assisti uma apresentação de José Mojica na Igreja N. S. do Carmo na Aclimação. O monsenhor responsável pela igreja não fez nenhum anúncio da apresentação para que somente os frequentadores assíduos da missa das 10h30 fossem premiados. Inesquecível
ResponderExcluirO filme EU PECADOR , não apresentou uma realidade muito boa na vida jovem do frei José Mojica.
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