Em 1937 os estúdios Disney lançaram seu primeiro longa de animação, Branca de Neve e os Sete Anões (Snow White and the Seven Dwarfs, 1937), que foi um sucesso na época, e contínua encantando gerações.
Até então, filmes dublados eram raros no Brasil (e no mundo), normalmente sendo exibidos com legendas. Mas como o público alvo de Branca de Neve eram as crianças emuitas delas ainda não alfabetizadas, ou sem prática em uma leitura rápida, foi preciso dublar o longa de animação, para a alegria da garotada.
No Brasil, para dar voz aos personagens de Branca Neve, os estúdios Disney foram buscar os artistas radiofônicos para tal empreitada. Foi o próprio Disney quem contratou o compositor Braguinha para fazer a versão brasileira das músicas e a adatação do texto. O cronista da revista Cinearte, Gilberto Souto, que morava há alguns anos em Hollywood, foi quem traduziu os textos originais. E Moacyr Fenelon e Wallace Downey, os pioneiros do cinema sonoro do país, foram os responsáveis pelo som e direção de dublagem, feitas nos estúdios da Sono-Films.
Para dublar Branca de Neve foi escolhida a cantora Dalva de Oliveira (1917-1972), na época uma cantora em começo de carreira, famosa por integrar o conjunto Trio de Ouro, ao lado do então marido Herivelto Martins.
Dalva de Oliveira, em 1937
Curiosamente, Dalva apenas fez os diálogos, não sendo a artista que emprestou voz as canções. Quem cantava na versão brasileira do filme era a soprano Maria Clara Tati Jacome (1905-1984).
Maria Clara, como as vezes era creditada (sem sobrenomes), também tinha experiência no rádio, mas havia ganho projeção após formar-se no Instituto Nacional de Música, onde foi discípula da professora Nicia Silva, e ingressar no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, onde estrelou espetáculos líricos bem sucedidos, como Fedora e Rogoletto.
Maria Clara Tati Jacome
O elenco brasileiro era composto por grandes nomes do rádio da época, como o cantor Carlos Galhardo deu voz ao príncipe encantado. Os principais papéis foram interpretado pelos seguintes artistas:
Cordélia Ferreira - Rainha Má
Estephania Louro - A Bruxa
Almirante - Meste e o Espelho Mágico
Aristóteles Penna - Zangado
Baptista Júnior - Feliz e Somneca (conforme a grafia da época)
Delorges Caminha - Dengoso
Edmundo Maia - Atchim
Túlio de Lemos - Caçador
Outros nomes como Bob Lazy, Castro Barbosa e Odyr Odilon fizeram vozes adicionais. E com pouco mais de dois anos, o pequeno Pery Martins, filho de Dalva, foi convocado para gravar os sons e reações do anão Dunga, que não falava. Anos mais tarde, o menino ficaria conhecido como Pery Ribeiro, outro grande cantor brasileiro.
O filme foi um grande sucesso de bilheteria, e a versão brasileira agradou ao público, que ainda estranhava a dublagem. Originalmente, Branca de Neve foi lançado em Portugal legendado, mas as cópias dubladas no Brasil foram enviadas para o país, e também fizeram um enorme sucesso.
Dalva de Oliveira e Maria Clara foram convidadas para serem homenageadas em algumas sessões em Lisboa, onde receberam todas as honras de uma estrela internacional.
Pouco tempo depois do lançamento da versão dublada, que chegou ao Brasil em 1939, Maria Clara se casou (em 1941), e abandonou a carreira. Já Dalva, em franca ascensão, se tornaria uma das maiores cantoras brasileiras.
Mas o sucesso do filme fez com que Dalva chegasse a ser creditada como "A Branca de Neve Brasileira". A cantora chegou a apresentar-se em um espetáculo de revista, destinado ao público infantil, como a personagem do filme. O espetáculo, lançado no carnaval de 1939, foi batizado A Cabana dos Sete Anões.
Em 1941, quando Walt Disney veio ao Brasil, Dalva cantou para ele no Cassino da Urca.
Dalva de Oliveira também seria uma presença marcante no cinema brasileiro. Seu primeiro filme foi o curta musical O Nego Está Sambando (1939), onde aparecia como integrante do Trio de Ouro. Ela ainda apareceria nos filmes Samba em Berlim (1943), Berlim na Batucada (1944), Pif-Paf (1945), Caídos do Céu (1946), Esta é Fina (1948), Fogo na Canjica (1948), Prá Lá de Boa (1949), Um Beijo Roubado (1950), Milagre de Amor (1951), Maria da Praia (1951), Tudo Azul (1952) Vou te Contá (1958) e Os Herdeiros (1970).
O filme tornou-se uma verdadeira febre no Brasil. Ganhou uma versão teatral nos palcos do João Caetano, tento a atriz Noemia Sores no papel principal. Também foi adaptado para o rádio teatro nas emissoras Nacional, Tupy e Cruzeiro. Publicaram histórias em quadrinhos baseadas no filme, brinquedos, e até produtos de limpeza doméstica da marca "Branca de Neve" eram comercializados por aqui.
Violeta Ferraz, como Branca de Neve, no microfone da Rádio Nacional
Anúncio do Saponácio Branca de Neve
Na Rádio Mayrink Veiga um jovem cantor negro foi batizado artisticamente de Branca de Neve, numa brincadeira prá lá de duvidosa. Havia também uma companhia teatral de anões, onde o integrante negro também usava o nome artístico de Branca de Neve.
O cantor Branca de Neve, na Mayrink
Infelizmente, o sucesso da versão dublada fez com que as cópias fossem exibidas a exaustão. Muitas delas foram perdidas, e as que sobreviveram, ficaram tão danificadas que tiveram que ser descartadas. Nenhuma delas sobreviveu ao tempo, e em 1965 Walt Disney mandou redublar o filme no Brasil, com novos artistas. Foi está versão que foi exibida nas televisões, e foi lançada em VHS e DVD anos mais tarde.
Mas em 1945 a gravadora Continental contratou Braguinha para comandar a coleção Disquinho, com discos de histórinhas infantis. O primeiro disco da coleção foi uma versão de Branca de Neve e os Sete Anões, com praticamente o mesmo elenco (só que sem Maria Clara, agora com Dalva interpretando as canções).
Graças a este trabalho, podemos ter uma noção de como era a dublagem de 1939, como podemos ver nesta cena mixada com o áudio dos discos gravados.
Confira a versão brasileira com Dalva de Oliveira
Em tempo: A primeira versão cinematográfica de Branca de
Neve foi feita ainda nos tempos do cinema mudo, tendo a atriz Margarite Clark como a famosa personagem dos contos de fadas, no filme Snow
White, em 1916. E em 1933 Betty Boop viveu Branca de Neve em uma
animação dos irmãos Fleisher.
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4 Comentários
Muito triste que não tenha restado um único registro dessa dublagem.
ResponderExcluirNo texto vc diz que a parte cantada não foi feito pela Dalva então esse vídeo q está no fim da matéria não seria ela, correto?
ResponderExcluirmuito boa
ResponderExcluirPorque não falam de Carlos Galhardo que foi a voz do príncipe?
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