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Butterfly McQueen, muito além da Prissy



Quem assistiu ao filme ...E O Vento Levou (Gone With the Wind, 1939) jamais esquecerá de Prissy (interpretada por Butterfly McQueen), a empregada de voz aguda que ajuda Scarlet O'Hara (interpretada por Viven Leigh) durante o parto de Melanie Wilkes enquanto Atlanta é bombardeada.


Thelma McQueen nasceu em 07 de janeiro de 1911, em Tampa, Flórida. Thelma queria ser enfermeira, mas um professor do ensino médio sugeriu que ela estudasse atuação. McQueen começou então a estudar dança, e foi no balé que ela ganhou seu nome artístico Butterfly (borboleta em inglês), uma referência a suas mãos sempre em movimentos como uma borboleta de Sonhos de Uma Noite de Verão. A atriz, que odiava seu nome, mudou ele legalmente para Butterfly anos mais tarde. Como dançarina, ingressou no elenco da companhia de dança de Katherine Dunham, e estreou profissionalmente no espetáculo Brow Sugar (1937), de George Abbott.

Durante uma viagem de trem, leu um anúncio de que procuravam atores negros para fazer figuração em um filme. A atriz se inscreveu para o teste e conseguiu o papel.

...E o Vento Levou foi seu primeiro filme, e apesar de sua curta participação, sua personagem é inesquecível para os cinéfilos. Mas a atriz não sentia orgulho de ter atuado neste clássico do cinema.

Hoje um dos maiores clássicos do cinema, ele foi considerado ofensivo para a comunidade negra, por retratar personagens estereotipados. Butterfly e sua colega Hattie MacDaniel, que se tornou a primeira atriz negra a vencer um Oscar não puderam assistir a estreia do filme por ele ter sido exibido em um cinema que só permitia espectadores brancos.

Butterfly e Hattie fazendo teste para figurino

Anos mais tarde, durante uma entrevista, ela declarou: "Eu não me importei em fazer uma empregada doméstica na primeira vez, porque pensei que era seria minha entrada no cinema. Mas depois de fazer o mesmo papel repetidamente, isso me ressentia. Eu não me incomodava em ser engraçada, mas não gostava de ser sempre estúpida."

E ela repetiu o papel de empregada abobalhada, meio infantil, em praticamente todos os filmes seguintes em que atuou, como As Mulheres (The Women, 1939), Volta Pra Mim (Affectionately Yours, 1941), Muralhas de Jericó (I Dood It, 1943), Desde que Partiste (Since You Went Away, 1944), Um Dia Voltarei (Flame of Barbary Coast, 1945), Alma em Suplício (Mildred Pierce, 1945) e Duelo ao Sol (Duel in the Sun, 1946). Muitas vezes nem sendo creditada por seu trabalho.
Com Eleanor Powell em Muralhas de Jericó

Com Joan Crawford em Almas em Suplício

Com Gregory Peck em Duelo ao Sol

Neste período, os únicos filmes onde não interpretou uma doméstica foram Uma Cabana no Céu (Cabin in the Sky, 1943) e Killer Diller (1948), este último feito para exibição em cinemas exclusivos para negros.

Com Ethel Waters em Uma Cabana no Céu

Após atuar em Killer Diller ela deixou o cinema, desgostosa de sua carreira. Conseguiu emprego no rádio, atuando primeiro no programa de Jack Benny e depois no programa Beulah, destinado ao público afro-americano. Entre 1950 e 1951 interpretou a mesma personagem, Oriole, na versão televisiva de Beulah. Em 1952 ela foi substituída por Ruby Dandridge (mãe de Dorothy Dandridge).







No final da década de 40 mudou-se para Nova York e se inscreveu em cursos em uma Universidade. Nos anos seguintes os papéis ficaram escassos. Para sobreviver, Butterfly teve diversos empregos, secretária em uma empresa de táxis, lavadora de pratos em um restaurante, operária em uma fábrica, acompanhante de idosos, costureira, vendedora de loja de departamentos e empregada doméstica. Em dificuldades financeiras, chegou a escrever uma carta para um congressista americano pedindo um emprego.

Em 1957 mudou-se para Augusta, na Georgia e passou a fazer trabalhos dedicados a comunidade negra da região. Teve seu próprio restaurante e criou muitos programas de assistência para crianças carentes. Ocasionalmente viajava para Nova York para atuar na Broadway. Em 1975 formou-se em ciências políticas na faculdade, aos 64 anos.

Nos anos 70 voltou a atuar no cinema, aparecendo em filmes como Conjunto de Espiões (The Phynx, 1970), e Amazing Grace (1974). Também atuou no especial para a televisão The Seven Wishes of Joanna Peabody (1978), que lhe valeu um Emmy de melhor atriz. 

Butterfly em Amazing Grace

The Seven Wishes of Joanna Peabody

Em 1979 foi agredida por seguranças de um terminal de ônibus, que a confundiram-na com uma batedora de carteiras. Foi jogada na calçada e quebrou várias costelas. Após vários anos brigando na justiça, foi indenizada em U$ 60.000,00 (sessenta mil dólares). Fez seus últimos filmes na década de 80, atuando com Harrison Ford em A Costa do Mosquito (The Mosquito Coast, 1986) e Polly - Uma Lição de Amor à Vida (Polly, 1989), um telefilme baseado no livro Pollyana, com artistas negros no elenco. Nesta época, ocupava a maior parte do seu tempo em trabalhos comunitários e atividades em prol dos animais e dos direitos civis.

Com Harrison Ford em A Costa do Mosquito

Em 1989 assistiu pela primeira vez ...E O Vento Levou em um cinema, 50 anos após ser barrada na sala de exibição original. Desta vez, como convidada de honra. Durante a exibição disse que agora sentia agora orgulho do papel que os negros conquistaram no cinema, e que naquele momento não sentia mais vergonha do papel que a eternizara. Em sua homenagem, foi lançada uma boneca de Prissy em edição comemorativa.

Elenco de ...E o Vento Levou na comemoração dos cinquenta anos do filme. Da esquerda para a direita: Butterfly McQueen (Prissy), Evelyn Keyes (Suellen O'Hara), Ann Rutherford (Carreen O'Hara), Rand Brooks (Charles Hamilton), Fred Crane (Brent Tarleton), Cammie King (Bonnie Blue Butler), Daniel Selznick (filho do produtor David O. Selznick), Mickey Kuhn (Beau Wilkes, o filho de Melaine criança), Greg Giese (o bebê de Melaine e Scarlet).

Boneca de Prissy


Butterfly nunca se casou, e não teve filhos. Também não tinha religião. Costumava dizer: "Meus antepassados se livraram da escravidão, eu sou livre da religião". Em 22 de dezembro de 1995 morava em uma pequena casa de um comodo na Georgia. Com a eletricidade cortada, acendeu um aquecedor de querosene para se esquentar no rigoroso inverno. Acidentalmente, o fogo alcançou suas roupas, ela ainda correu para a calçada, mas não resistiu aos ferimentos que queimaram 70% do seu corpo. Seus vizinhos só souberam que a "Dona Thelma" era famosa quando os bombeiros encontraram seu prêmio Emmy derretido entre os escombros de sua casa. Butterfly tinha 84 anos, e seu último pedido para os bombeiros que tentaram socorrê-la foi que doassem seu corpo para a ciência, o que foi feito.

O prêmio da atriz derretido, hoje em um Museu.


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7 Comentários

  1. Lamentável uma vida tão cheia de angústias e injustiças.

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    1. É verdade, muito triste mesmo e uma pessoa injustiçada, sem nenhum reconhecimento, mais por causa da cor da pele.

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  2. Nossa, que apanhado maravilhoso sobre ela! Posso usar alguns trechos na minha página de cinema? Coloco a fonte e o link.

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  3. Meu Deus, que vida sofrida!! Que Deus a tenha, é uma vergonha pra toda a humanidade que um dia tenha existido e ainda exista a escravidão.

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  4. História de muita injustiça e tristeza. Racismo cruel...

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  5. Muito triste, uma vida de injustiças...

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